abalos sísmicos

esse silêncio
significa
que a gente
descarrilhou?

esse tremor
você também sentiu?
que deitamos
no trilho

ou

é normal
que um planeta
habitável
como o nosso
tenha os seus
abalos sísmicos

pele indefinida

me perdi nessa miragem 
qualidade do que transita
não sou terra mas sou margem
na imagem refletida você cita
pensadores, calabouços 
calafrios
sou margem mas não sou rio
estou à margem da cor

fenótipo incógnita 
na dimensão estética
apreensão simbólica 
impede que se revele

a beleza retida

não vejo como ferida
quantas cores numa pele
minha pele
indefinida
enquanto você dorme
momento preferido
observo o universo 
no seu rosto
estático

quase todo dia
tento te convencer de algo
por querer estar certo
provoco breve rubra
no seu rosto
pálido

admiro sua teimosia
em querer conviver com a minha

mas seu sono
é como uma outra dimensão
te cubro
mas você já está coberta
de razão
na praia
barracas de madeira
com teto de lona
ou de palha
frágeis estruturas

um homem
puxando seu barco
o corpo fino
o rosto velho
a pele escura
frágil estrutura

mãe perde o filho
braços magros
essa angústia
esse século
essa dúvida
frágeis
estruturas

pósmodernidade

nada é muito novo
você não sabe o que está falando

há uma materialidade
em que tudo se baseia
há um movimento
histórico
historicidade

o poema é ir além

não há poesia
sem uma base
a transpor

você não sabe o que tá falando
é por isso que não me diz nada
pós-moderno nada

alameda

como eu vim parar aqui?
sem entender as ruas
do subúrbio do rio

em ouro preto
passei muito frio
olhando as montanhas 
nas ruas de pedra

tenho 8 anos
e o gato doente
que achamos
morreu

como vim parar em Natal?
sem falar com vitória
após terminarmos
mas se olhar pra trás
na ladeira de tabatinga
dá pra ver o mar

como vim parar aqui?
tão longe
tão longe no futuro
tão longe na memória
imagina
um ano no porto
outro em cotovelo
rabiscar um modelo
de casa
em são francisco do sul

tem cidade que é poema
só de pensar
talvez eu só esteja surpreso
por não sentir coisa alguma

eu penso
em manusear armas de fogo
estudar hagiografia
começar uma horta
aumentar a resistência física ler
crítica da economia política

das kapital

mas por quem você se tornou
eu sinto absolutamente nada


análise excessiva

peguei a doença
da análise excessiva
é o que mata o poema

a tarde murcha entre os prédios:
geografia crítica

etnografia
do almoço no Itaim
saio ileso ao ver gravatas
humilhando um garçom

afastamento do objeto

Brecht versava política
é a sociologia
o que mata o poema

o rosto seco do sal
a pele seca do sol
repouso meu conforto
no desconforto
dessa sensação

não é que o concreto não busque o infinito
não é que o verde não reflita o ancestral
mas o mar insiste nesse alívio
de lar derradeiro
descanso final